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Asma Brônquica

Resposta Tardia da Asma

Arginina, Arginase e Asma

Em junho de 2003 Nives Zimmermann da Divisão de Alergia e Imunologia do Cincinnati Children's Hospital Medical Center - OH - EUA e seus colegas de Canberra - Austrália, Montreal - Canadá e San Diego - CA - EUA,  anunciaram a identificação de um conjunto de 291 sequências de DNA humano provavelmente relacionadas com a asma.1 Os genes foram identificados com a tecnologia de chips de DNA (DNA microarray analysis), que permite analisar simultaneamente a expressão de múltiplos genes. A asma foi provocada em camundongos utilizando dois alérgenos conhecidos: uma proteína do ovo, a ovoalbumina (OVA) e um fungo, o Aspergillus fumigatus. Após a indução da doença, os pulmões dos animais foram analisados utilizando-se a técnica de Chips de DNA a fim de se observar as mudanças na expressão gênica. Constataram que 6,5% dos 12.422 genes analisados demonstravam uma expressão alterada no pulmão dos animais submetidos à provocação alérgica, quando comparado aos animais submetidos a provocação com solução salina. Um dado importante foi a constatação de que entre os genes identificados – 496 no modelo da OVA e 527 no modelo Aspergillus, 291 eram comuns aos dois grupos.

Dentre estes genes expressos pelos camundongos sensibilizados os autores relataram os genes da arginase I, arginase II e o transportador de L-arginina, transportador de aminoácidos catiônicos (CAT)2, moléculas envolvidas no metabolismo da arginina.

O óxido nítrico (NO) é produzido por uma grande variedade de células como as células epiteliais, as células nervosas, as células inflamatórias (neutrófilos, macrófagos, mastócitos) e as células endoteliais. O NO é um gás livremente difusível, é formado a partir do aminoácido semiessencial L-arginina (desaminação), quando de sua transformação em L-citrulina, através de uma reação mediada pela enzima sintase do óxido nítrico (NOS). A NOS catalisa uma oxidação de cinco elétrons de um nitrogênio amidina da L-arginina. N-hidroxi-L-arginina é um intermediário que permanece firmemente ligado à enzima (Figura 1).

Os produtos finais desta reação enzimática são em quantidades equimolares, o NO e a L-citrulina, formados através de monoxidação com Nwhidroxiarginina que é um intermediário que permanece ligado firmemente à enzima. Este processo requer oxigênio como um cosubstrato e NADPH como fonte de elétrons.

A L-arginina funciona como substrato para a enzima arginase e para a sintase do óxido nítrico  (cNOS e iNOS).

As vias da arginase e da NOS podem, portanto, interferir uma com a outra, através da competição do substrato. O NO endógeno é uma molécula ubíqua produzida pela NOS constitucional (cNOS), em concentrações picomolares, sendo responsável pela manutenção da homeostase,2-4 regulando vários aspectos da  biologia das vias aéreas, como o tônus do musculo brônquico e vascular.5 Nesta nova hipótese, a atividade da arginase potencializa a responsividade das vias aéreas, inibindo a cNOS por depleção do substrato, reduzindo a produção de NO broncodilatador.

As células epiteliais de pacientes com asma expressam reduzida concentração de L-arginina para níveis aumentados da iNOS e e pode conduzir à geração de peroxinitritos e radicais hidroxila, contribuindo para o aumento da contratilidade do músculo liso brônquico, inflamação das vias aéreas, com consequente dano tecidual.

Uma recente teoria sobre a asma relaciona a arginina, a arginase e o NO endógeno (Figura 1).6 A arginase I e a arginase II controlam a transformação da arginina em ornitina, que por sua vez dá origem a prolina e poliaminas.7,8 A arginase I é uma proteína citoplasmática que participa do ciclo da biossíntese da ureia, sendo expressa primariamente em grande quantidade no fígado. A arginase II é uma proteína mitocondrial expressa em vários tecidos, principalmente na próstata e nos rins.9 A exata função da arginina extra-hepática agota é que começa a ser esclarecida. Entretanto, o aumento de sua expressão é capaz de aumentar a síntese da prolina e/ou poliaminas, como a putrescina, espermidina e espermina, essenciais no metabolismo que controla a produção e proliferação de colágeno, com efeitos no tecido conjuntivo e a proliferação de músculo liso vascular,10 de células endoteliais11 e sintese de muco.7,8 As arginases I e II são expressas constitucionalmente nas vias aéreas, particularmente no epitélio brônquico e nos fibroblastos.12-14

Na resposta asmática tardia o aumento da atividade das arginases pelas citocinas TH2 (IL-4, IL-13) e pelo TGF-ß nas vias aéreas determina uma reduzida disponibilidade de L-arginina para aumento da expressão da iNOS, causando uma deficiência de NO, bem como aumento da formação de peroxinitrito (ONOO-), o que pode estar relacionado à obstrução das vias aéreas provocada por alérgenos, à inflamação e hiper-responsividade e à maior sensibilidade aos alérgenos. Além disso, a atividade aumentada da arginase eleva a produção de L-ornitina e seus produtos de síntese, poliaminas e L-prolina, as quais podem ter participação no remodelamento das vias aéreas, através da proliferação celular, intensificando a produção do colágeno e da fibrose, respectivamente (Figura 2).15

Através da hibridização in situ para a arginase I mRNA, Zimmermann et al.1 detectaram pela técnica antisense em pulmões de um modelo experimental de asma, altos níveis de arginase I em áreas de inflamação peribrônquica e perivascular. No entanto, em camundongos do grupo controle, não houve expressão detectável da enzima.

Na mesma publicação1 os autores apresentam um estudo efetuado em humanos, quando analisaram a expressão da proteína L-arginase I, no lavado broncoalveolar (Figura 3), em pacientes com asma e em um grupo controle. Obtiveram por imuno-histoquímica um número significativo de células que expressavam a arginase I no grupo com asma, principalmente em macrófagos e células mononucleares. A hibridização in situ em biópsias brônquicas destes pacientes detectou intensa  concentração de células arginase I mRNA, tendo sido indetectável no grupo controle.

Em um modelo de asma utilizando porquinhos-da-índia, Maarsingh et al. empregando um potente inibidor específico da arginase por inalação, o ácido 2(S)-amino-6-boronohexanoic (ABH), obtiveram considerável redução da reação asmática precoce e tardia, presumivelmente atenuando a deficiência de substrato induzida por arginase para NOS nas vias aéreas após provocação com alérgeno. Além disso o ABH reduziu a hiper-responsividade brônquica e a inflamação, indicando o potencial que os inibidores das arginases podem apresentar como tratamento na asma alérgica.16

Referências

01.Zimmermann N, King NE, Laporte J, Yang M, Mishra A, Pope SM, Muntel EE, Pegg AA, Foster OS, Hamid Q, Rothenberg ME. Dissection of experimental asthma with DNA microarray analysis identifies arginase in asthma pathogenesis. J Clin Invest 2003; 111:1863-74.

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09.Iyer R et al. The human arginases and arginase deficiency. J Inherit Metab Dis 1998; 21:86.

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11. Li H et al. Activities of arginase I and II are limiting for endothelial cell proliferation. Am J Physiol Regul Integr Comp Physiol 2002; 282:R64.

12. Meurs H, Maarsingh H, Zaagsma J. Arginase and asthma: novel insights into nitric oxide homeostasis and airway hyperresponsiveness. Trends Pharmacol Sci 2003;24:450–455.

13. Ricciardolo FL, Zaagsma J, Meurs H. The therapeutic potential of drugs targeting the arginase pathway in asthma. Expert Opin Investig Drugs 2005;14:1221–1231.

14. Que LG, Kantrow SP, Jenkinson CP, Piantadosi CA, Huang YC. Induction of arginase isoforms in the lung during hyperoxia. Am J Physiol 1998;275:L96–L102.

15.Meurs H, Zaagsma J, Maarsingh H, van Duin M. Recent patents in allergy.immunology: Use of arginase inhibitors in the treatment of asthma and allergic rhinitis. Allergy. 2019;74:1206–1208.

16. Maarsingh H, Zaagsma J, Meurs H. Arginase: a key enzyme in the pathophysiology of allergic asthma opening novel therapeutic perspectives. Br J Pharmacol2009;158:652-664.

Última Atualização: - 10/10/2019