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Asma Brônquica

FATOR DE NECROSE TUMORAL ALFA

As alterações brônquicas no fenótipo da asma severa refratária diferem daquelas encontradas na asma leve a moderada, encontrando-se uma resposta de configuração inflamatória mais heterogênea,1 com a participação só de neutrófilos2 ou em associação com eosinófilos, com intensa participação do pulmão distal3 e remodelamento brônquico.4 Inicialmente acreditava-se que este processo ocorresse em decorrência da resposta aos corticoides inalados, pois, contrariamente ao efeito pró-apoptose nos eosinófilos, os corticoides estimulam a sobrevida dos neutrófilos.5 Na asma severa os neutrófilos parecem estar em estado de ativação,6 havendo correlação entre o seu número e o grau de dano tecidual das vias aéreas,7,8 configurando uma resposta terapêutica reduzida aos corticoides.9

Estas mudanças são explicadas pela mudança na conformação inflamatória, na direção TH2 para TH1, com aumento da expressão do fator de necrose tumoral alfa (TNF)-a e do interferon-g (IFN)-g.10

A atividade biológica do TNF-a é mediada pela proteína precursora transmembrana 26-kD (membrane-bound TNF-a) bem como pelo produto de clivagem 17-kD, o TNF-a livre. O TNF-a é uma citocina inflamatória pleiotrófica expressa em quantidades aumentadas pelos monócitos ativados, macrófagos, linfócitos e mastócitos,11 como um homotrímero composto por três moléculas TNF 17-kD. O TNF-a é liberado pela membrana celular através da atividade da enzima conversora do TNF (TACE). A atividade TNF-a é mediada através da ligação aos receptores de membrana (p55 e p75 TNFR) encontrados em diferentes células, como leucócitos, células dendríticas, células endoteliais vasculares e células mesenquimais. Uma molécula de TNF-a deve se combinar a dois ou mais TNFRs para iniciar a transdução do sinal intracelular. A atividade TNF é naturalmente regulada pela produção de TNFRs solúveis os quais tornam o TNF-a biologicamente indisponível, impedindo a sua ligação aos receptores de membrana celular.12 (Figura 1)

O TNF-a foi originalmente descrito como um fator indutor da necrose de alguns tumores. Na atualidade é reconhecido como uma importante citocina pró-inflamatória, com largo espectro de ação que inclui recrutamento de neutrófilos através da indução de moléculas de adesão na parede vascular endotelial e indução da síntese de citocinas e quimocinas.

Níveis elevados de TNF-a foram detectados no escarro,13,14 no lavado broncoalveolar15 e em biópsias de pacientes com asma.16 A inalação de TNF-a determina hiper-responsividade brônquica e aumento da neutrofilia do escarro em voluntários.17 A importância do TNF-a como uma citocina multifuncional na asma severa refratária tem sido reforçada pela constatação de aumento de mais de 30 vezes na sua expressão gênica nas vias aéreas. Ocorre aumento na expressão do precursor de membrana TNF-a de células mononucleares, na TACE e de seus receptores p75 e p55,18 assim como no incremento da secreção de TNF-a solúvel mesmo na presença de altas doses de corticoides. De especial relevância deve ser salientado que o TNF-a tem o efeito potencial de estimular fibroblastos, miofibroblastos e células musculares lisas induzindo e liberando proteases.19,20 Através destas variadas atuações o TNF-a contribui de forma substancial na patogênese da inflamação crônica das vias aéreas, incluindo o remodelamento brônquico. O TNF-a tem potente efeito direto no músculo liso determinando hiper-responsividade das vias aéreas. Os mecanismos responsáveis por esta mudança no fenótipo inflamatório não são conhecidos, embora o TNF-a tenha demonstrado aumentar os níveis da isoforma-b dos receptores de corticoides21 e apresente múltiplos efeitos na inflamação e na estrutura celular das vias aéreas.

tnf infliximab 2Existem vários estudos em andamento, sugerindo que o TNF-a se constitua em um importante mediador inflamatório na asma severa. Duas modalidades terapêuticas utilizam esta nova via, utilizando os TNFRs solúveis recombinantes e anticorpos monoclonais contra o TNF-a. Os TNFRs solúveis recombinantes mimetizam a atividade dos TNFRs naturais e quando de sua ligação  com o TNF previnem a interação com o TNFR da membrana celular. A droga mais avaliada é o etanercept, já utilizado no tratamento da artrite reumatoide, e em fase de análise na asma brônquica, com resultados promissores.18 A segunda abordagem terapêutica utiliza o infliximab, um anticorpo monoclonal IgG1 quimérico constituído por 75% de proteína humana e 25% de proteína de murídeo.22 A porção de murídeo contém o sítio de ligação para o TNF-a, enquanto a porção humana é responsável pela função efetora (Figura 2).12 O infliximab liga-se especificamente ao TNF-a e assim neutraliza tanto o TNF-a transmembrana como o TNF-a solúvel. Além disso, estudos in vitro mostraram que o infliximab provoca lise de células produtoras de TNF através de fixação do complemento ou citotoxicidade dependente de anticorpos (ADCC: Antibody-Dependent Cytotoxity).23

A TACE (TNF-a-converting enzyme) é a enzima  metaloprotease importante para a liberação do TNF-a pela superfície celular. Pequenas moléculas que bloqueiam a TACE estão sendo desenvolvidas como inibidoras do TNF-a porém, sem aplicação clínica até o momento devido a efeitos residuais. 

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