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Asma Brônquica

ASPERGILOSE BRONCOPULMONAR ALÉRGICA

A aspergilose broncopulmonar alérgica (ABPA) é um endótipo da asma e se não for convenientemente tratada pode evoluir para bronquiectasias e fibrose.

A prevalência de ABPA na asma é de cerca de 16%1 enquanto que na fibrose cística > 15%,2 sendo que a prevalência da ABPA na asma não varia de acordo com a gravidade da asma.3 Por outro lado, Saxena et al. observaram uma prevalência de 41% de asma com sensibilização ao Aspergillus fumigatus em pacientes com doença grave, utilizando IgE específica para A. fumigatus e de 30% através de teste cutâneo.1

Em 1952, Hinson, Moon e Plummer4 do London Chest Hospital descreveram oito casos de ABPA sob o título de "Broncho-pulmonary Aspergillosis". Destes oito casos, cinco foram considerados como micetomas, contendo espécies Aspergillus e foram classificados como do tipo saprófita. Os outros três, duas mulheres com idades de 45 e 55 anos e um homem de 37 anos, apresentavam episódios febris recorrentes com tosse severa do tipo produtiva purulenta. O escarro continha eosinófilos, espirais de Curschmann e cristais de Charcot-Leyden. A asma era indiscutível em dois pacientes e sibilos eram descritos no terceiro. Todos apresentavam eosinofilia maior que 1.000 células mm3. Dois apresentavam bronquiectasias saculares e o outro “rolhas” de muco visualizadas na broncoscopia. O paciente masculino evoluiu para óbito em decorrência de mal asmático e todos apresentavam história de exposição ao fungo, por criação de galinhas, moagem de trigo e jardinagem com utilização de fertilizantes contaminados. Como todos os três apresentavam eosinofilia os autores propuseram etiologia alérgica para a doença.

Entretanto, os primeiros esforços para formular critérios diagnósticos para a ABPA foram introduzidos em 1977 por Rosenberg et al.5

A ABPA está associada a reações de hipersensibilidade dos tipos I e III ao A. fumigatus inalado. Os conídios (esporos) inalados de Aspergillus devido ao seu pequeno diâmetro (2 a 3 micrômetros) se propagam facilmente atingindo as vias aéreas, germinam em hifas, com liberação de antígenos que ativam as respostas imunes inatas e adaptativas (respostas de células TH2) do pulmão. Sua patogênese é estabelecida através de níveis elevados de IgE sérica, reação de hipersensibilidade cutânea imediata com ou sem reação de Arthus e presença de IgE, IgG e/ou anticorpos específicos precipitantes de A. fumigatus.5-8

Pepys et al.9 foram os responsáveis pelo esclarecimento das bases alérgicas da doença, desenvolvendo extratos de Aspergillus com os quais demonstraram respostas in vivo e in vitro.

A ABPA é provavelmente uma doença pulmonar poligênica de hipersensibilidade TH2 causada por qualquer uma das numerosas espécies do gênero Aspergillus que abriga mais de 180 espécies,10 sendo a maioria das infecções em humanos determinada pelo Aspergillus fumigatus11 e ocasionalmente pelo Aspergillus flavus, Aspergillus niger, Aspergillus clavatus, Aspergillus nidulans e Aspergillus terreus. Os fungos do gênero Aspergillus são ubíquos, sendo encontrados praticamente em qualquer ambiente: água, ar e solo.  São saprófitos e existem em qualquer lugar onde exista matéria orgânica em decomposição, tolerando condições ambientais extremas, sendo termotolerantes, apresentando crescimento entre 12º e 52ºC. Qualquer pessoa está exposta diariamente aos esporos deste fungo, sendo impossível evitá-lo.12 A identificação em nível tecidual baseia-se principalmente em três achados: uniformidade no tamanho das hifas (2–4 µm de largura), septação frequente e ramificações dicotômicas de aproximadamente 45º (Figura 1).

Outros fungos filamentosos, como Penicillium, Curvularia spp e Schizophyllum commune, podem causar patologia semelhante chamada de Allergic Bronchopulmonary Mycosis (ABPM),13,14 quando atribuível a fungos que não sejam Aspergillus spp.

Susceptibilidade genética à ABPA na asma é descrita. Um estudo de associação genética identificou SNPs (Polimorfismo de Nucleotídeo Único) em genes candidatos, incluindo TLR3, IL4R e IL-13 que estão associados à ABPA e que ajudam a fundamentar a participação desses receptores e vias na resposta imune ao A. fumigatus e na susceptibilidade à ABPA.15 Chauhan et al. avaliaram o locus HLA-DR e o envolvimento dos genes HLA-DQ no desenvolvimento da ABPA. Concluíram que as moléculas HLA-DR DR2, DR5 e possivelmente DR4 ou DR7 contribuem para a susceptibilidade, enquanto o HLA-DQ2 contribui para a resistência à doença. Uma combinação deles pode determinar o desfecho da ABPA na fibrose cística e na asma.16,17

O quadro clínico típico da ABPA se caracteriza por: atopia, rinite, alergia às drogas, conjuntivite alérgica, história de asma mal controlada que se apresenta com exacerbações frequentes, tosse, expectoração de aspecto compacto/sólido ("rolhas"). Esta expectoração tem um aspecto de um molde brônquico, de coloração acastanhada, determinando o que se denomina de impactação mucoide ou bronquite plástica.18,19 Estes moldes podem se apresentar de forma larga e linear ou com configuração de Y ou V ou como um cacho de uvas, dependendo da extensão do brônquio comprometido e se a bifurcação é afetada. Os moldes são  compostos por filamentos, ditos hifas, que constituem uma trama que representa o corpo vegetativo dos fungos, células inflamatórias e muco. As grandes vias aéreas também podem ser obstruídas por muco e hifas impactadas.

A patogênese da ABPA implica exposição e inalação de esporos. Devido às características estruturais, eles se fixam em brônquios mais calibrosos e, por serem termofílicos, germinam produzindo alta concentração de antígenos que estimulam o sistema imune local e sistêmico, com formação de anticorpos específicos de todas as classes, principalmente E, G e A. O fungo não invade os tecidos, permanecendo como saprófita na luz das vias aéreas. Determinam uma resposta imunológica com altos níveis de IgE específica contra o Aspergillus,20,21 com elevação da IgE total,21,22 bem como eosinofilia.17 A via clássica do sistema do complemento é ativada pelos complexos imunes formados pelas subclasses 1 e 3 da IgG com antígenos do Aspergillus. A via alternativa pode ser ativada tanto pela IgA 1 e 2 quanto pelas enzimas proteolíticas produzidas pelo fungo. Esta ativação gera produtos biologicamente ativos, que juntamente com as enzimas aumentam ainda mais a injúria tecidual, proporcionando maior adsorção de antígenos. Apesar da existência de complexos imunes, é importante salientar que eles atuam localmente, não sendo a ABPA uma doença de complexos imunes circulantes.21

O próprio fungo contribui substancialmente para a patogênese da doença. As proteases derivadas do Aspergillus fumigatus provavelmente causam lesão das células epiteliais e rotura da barreira protetora, desencadeando reação de hipersensibilidade, induzindo à inflamação e permitindo maior penetração de antígenos fúngicos na parede da via aérea.23 As proteases derivadas de Aspergillus também podem estimular a liberação de citocinas pró-inflamatórias, como a IL-8 e de fatores de crescimento e também podem causar danos nos tecidos, levando a bronquiectasias.24 Também são liberadas outras citocinas como IL-4, IL-5 e IL-13, que aumentam os eosinófilos no sangue e nas vias aéreas, bem como a IgE. Metaplasia escamosa da mucosa brônquica é comum e granulomas podem se desenvolver. Com a inflamação de longa duração, fibrose brônquica e bronquiolite obliterante podem ocorrer.

Estudos imunológicos demonstram a presença de reação de hipersensibilidade Tipo I com elevação dos níveis séricos da IgE total e da IgE específica para o Aspergillus fumigatus com ABPA. Por outro lado, existem evidências para uma exagerada reação Tipo III de hipersensibilidade, indicando a presença de anticorpos IgG específicos para o Aspergillus fumigatus, classicamente chamados de precipitinas ou anticorpos pecipitantes, e complexos circulantes durante as exacerbações da doença.

Não existe predominância de sexo. A maioria dos pacientes tem episódios de dispneia devido à asma.  A reação antígeno-IgE ocorrendo continuamente nas vias aéreas conduzirá a uma exacerbação clínica da asma, com episódios febris intermitentes (38–40ºC), expectoração mucopurulenta, às vezes com agregados de eosinófilos, com “rolhas” de muco (2–3 mm) de coloração escura, que corados pela prata, permitem a identificação de hifas septadas de Aspergillus. Microscopicamente, as rolhas de muco mostram camadas de eosinófilos em degeneração mescladas na mucina e o pulmão circundante pode mostrar pneumonia eosinofílica irregular.25

Os episódios recorrentes da aspergilose alérgica podem gradualmente destruir a mucosa brônquica causando bronquiectasias saculares proximais, assim como evolutivamente destruição parenquimatosa e fibrose intersticial. A causa das bronquiectasias em pacientes com ABPA decorre de uma reação imune à exposição às altas concentrações de alérgenos de Aspergillus, com liberação de uma variedade de proteínas como catalases, proteases, fosfolipases, hemolisina, superóxido dismutases e outras toxinas, que possuem atividade biológica além de imunológica e as ações de mucotoxinas, elastase, IL-4 e IL-5, sendo que em estágios bem mais avançados da doença, por invasão direta da parede brônquica pelos fungos. Acometem principalmente os lobos superiores, sobretudo as vias respiratórias mais verticais, estando ausentes no estágio inicial da doença.21 Quando presentes, o paciente passa a apresentar abundante expectoração do tipo purulento e infecções pulmonares recorrentes ou fibrose pulmonar, ou ambas com dispneia progressiva.26,27 O prognóstico é variável. Alguns pacientes evoluem sem que haja perda funcional apesar de episódios recorrentes da doença. Outros, entretanto, evoluem para asma corticoide dependente. O estágio final  é o de fibrose com obstrução brônquica irreversível que evolui para insuficiência respiratória e morte. 

Para fins práticos, Patterson et al.28 identificaram cinco estágios da ABPA: I) aguda, II) remissão, III) exacerbação, IV) asma esteroide resistente (AER) e V) ABPA fibrótica. O estágio agudo corresponde ao primeiro episódio da doença, com infiltrados pulmonares "fugazes" e bronquiectasias proximais, associadas a níveis elevados de IgE > 1.000 ng.l-1 (ou 417 kU/L), IgG específica > 5 X e precipitinas contra o Aspergillus. A contagem de eosinófilos no sangue periférico é geralmente maior que 1.000 mm3 e valores maiores que 3.000 são comuns. A detecção do antígeno galactomanana no soro através de um ensaio imunoenzimático (ELISA) foi aprovada para diagnosticar a aspergilose pulmonar invasiva. No entanto, devido à sua baixa precisão nos testes séricos de galactomanano na ABPA não é recomendado para diagnóstico nesta condição.29

Após o tratamento com corticoides, o infiltrado desaparece e o paciente entra em remissão. Após a retirada do corticoide, todavia, o paciente pode experimentar exacerbações assintomáticas ou sintomáticas. As exacerbações assintomáticas são detectadas pela presença de infiltrados radiológicos ou pela elevação de IgE ou da IgA específica para Aspergillus fumigatus. Muitos pacientes com ABPA tornam-se corticoide dependentes pois a redução da droga resulta em asma severa. Por último, alguns pacientes com ABPA desenvolvem severa fibrose pulmonar, apesar de toda a terapêutica. Alguns  podem evoluir para a fase de fibrose, ou de bronquiectasias crônicas, enquanto que outros permanecem longo tempo em remissão. Deve ser ressaltado que a ABPA é uma doença de curso prolongado, requerendo constante monitorização radiológica e avaliações seriadas da IgE.

As manifestações radiológicas da ABPA,30 são evidentes tanto na radiografia simples de tórax (50% de sensibilidade para o diagnóstico de ABPA) como na tomografia computadorizada do tórax de alta resolução (HRTC). Lynch31 comparando os dois métodos detectou bronquiectasias nas radiografias de tórax em cerca de 11 de 19 pacientes com ABPA, enquanto a tomografia computadorizada (TC) detectou a mesma anormalidade em 18 dos 19 pacientes. A TC é considerada o método principal para a detecção de bronquiectasias, principalmente após o advento da técnica de HRTC.

A TC é importante na identificação do tipo e na distribuição de bronquiectasias e ainda no reconhecimento de tampões de muco, configurando vantagens da TC em relação à radiografia de tórax.32,33 Impactação mucoide de alta atenuação (muco visualmente mais denso que os músculos paraespinhais na TC de tórax sem contraste) é uma característica patognomônica encontrada em pacientes com ABPA.34 A sensibilidade e a especificidade deste achado são de 35% e 100%, respectivamente.34,35

Opacidades alveolares pulmonares fugazes são comuns,25 podendo também permanecer imutáveis por semanas ou meses, como também podem aumentar. Nódulos centrolobulares representando bronquíolos dilatados e opacificados são detectados.12 Bronquiectasias com impactação mucoide resultam em broncocele, com imagem em “dedo de luva". Isso pode dar uma configuração Y, V ou semelhante à imagem em "pasta de dente". Essas imagens homogêneas digitiformes, estão localizadas na árvore brônquica, principalmente nos lobos superiores e quase sempre em brônquios proximais (lobar, segmentar ou subsegmentar de primeira ordem). Podem ocorrer eventualmente atelectasias lobares ou segmentares, coincidindo com a exacerbação da doença, bem como atelectasias que acometem brônquios mais distais. As bronquiectasias são geralmente do tipo cilíndrico e saculares de localização central (Figura 2). Após a expectoração da “rolha” de muco, persiste dilatação brônquica residual, podendo ou não conter imagem hidroaérea. A impactação mucoide tende a reaparecer no mesmo local.

Sob o aspecto de correlação entre achados radiológicos e histopatológicos, os infiltrados pulmonares da ABPA correspondem a áreas de infiltração eosinofílica alveolar. Estas opacificações podem ser lobares, segmentares ou subsegmentares, medindo entre 1 e 5 cm de diâmetro, sendo frequentemente migratórias.25 Como estes infiltrados podem não estar associados às bronquiectasias, a dosagem  das precipitinas séricas contra os Aspergillus torna-se a única forma de confirmação da ABPA nestes pacientes. O diagnóstico diferencial deve ser feito com pneumonias, Bronquiolite Obliterante com Pneumonia Organizada (BOOP), Síndrome de Churg-Strauss (SCS), pneumonia eosinofílica crônica, que podem também evoluir com eosinofilia, aspergilose necrotizante crônica, tuberculose, pneumonite de hipersensibilidade e outras causas de bronquiectasias.

A broncofibroscopia pode revelar impactação mucoide e o escovado brônquico evidenciar muco que contém agregados de eosinófilos, hifas e cristais de Charcot-Leyden. O achado de tampões de muco pleno de hifas é patognomônico da ABPA. A análise do lavado broncoalveolar (LBA) demonstra: eosinofilia moderada (nos pacientes que não fazem uso de corticoide) e aumento dos níveis da IgE e IgE específicas para Aspergillus mas não de IgG.36 A broncofibroscopia não é recomendada rotineiramente para o diagnóstico de ABPA.

O diagnóstico é confirmado pela dosagem de precipitinas quase que invariavelmente positivas na fase aguda em 90% dos casos,37 reduzindo-se nas remissões. O imunoensaio e a imunoprecipitação (precipitinas) são métodos padrão para detectar IgG contra Aspergillus fumigatus. Uma meta-análise recente detectou que a sensibilidade combinada dos imunoensaios é melhor que a imunoprecipitação.38 A IgE total eleva-se, alcançando valores acima de 1.000 UI/ml exceto nos estágios II e V (remissão e fibrose respectivamente). Ocorrem também aumentos da IgE específica anti-Aspergillus (RAST) e de anticorpos IgG anti-Aspergillus (ELISA) no soro (Tabela 1). O índice IgE Af/IgG Af tem valor diagnóstico quando acima de 2, e é calculado de acordo com as dosagens de IgE e IgG específicas no soro do paciente estudado, permitindo o diagnóstico na fase inicial da doença quando ainda não existem bronquiectasias.21

Tabela 1 Estadiamento da Aspergilose Broncopulmonar Alérgica em Asmáticos

ESTADIAMENTO DA ASPERGILOSE BRONCOPULMONAR ALÉRGICA EM ASMÁTICOS
ESTÁGIO
IgE
Precipitina
Eosinofilia
IgE-Af
IgG-Af
Imagem
I
Agudo
+++
+
+
+
+
+
II
Remissão
+
±
-
±
±
-
III
Exacerbação
+++
+
+
+
+
+
IV
Corticoide Dependente
++
±
±
±
±
-
V
Fibrose
+
±
-
±
±
-

Os testes de hipersensibilidade cutânea imediata  por puntura (extrato com diluição 1:50) são positivos para o Aspergillus fumigatus em cerca de 90% dos casos de doença aguda. Uma reação tardia pode ocorrer cerca de 4–6 h após (reação mediada por complexos imunes-hipersensibilidade Tipo III). Se a reação tardia não ocorrer após o teste de puntura, um teste intradérmico com 0,1 ml de um extrato de Aspergillus com diluição 1:100 pode ser efetuado. O teste mais potente só é efetuado se a reação imediata do teste de puntura for < 10 mm de diâmetro. Deve ser salientado que a reação ao teste cutâneo e os achados serológicos dependem primordialmente da qualidade do extrato fúngico utilizado.

Hifas podem ser visualizadas por microscopia no exame do escarro. A cultura de escarro demonstra o Aspergillus de forma intermitente, pois o fungo pode crescer distalmente à obstrução brônquica pela "rolha" de muco, não sendo encontrado na expectoração.  A colonização brônquica pelo fungo pode ser detectada pelo PCR do lavado broncoalveolar em 10 a 20% dos pacientes imunocompetentes e que têm achados clínicos e radiológicos de doença broncopulmonar associada ao Aspergillus.39 A sensibilidade e especificidade da cultura fúngica de escarro são baixas no diagnóstico de ABPA.

As principais características patológicas da ABPA são impactação mucoide dos brônquios, granulomatose broncocêntrica, bronquiectasias e pneumonia eosinofílica.40 Os dois primeiros achados são econtrados em praticamente todos os casos.41 A histopatologia evidencia brônquios irregulares com muco, células inflamatórias e hifas de Aspergillus; paredes brônquicas e parênquima peribrônquico infiltrados por mononucleares e eosinófilos. Um grande número de eosinófilos, células gigantes multinucleadas e a formação de granuloma são encontrados no parênquima nas áreas de consolidação.42 Distal a esses brônquios, exsudativa bronquiolite pode estar presente.41 Em estágios mais avançados, bronquiolite obliterante e fibrose pulmonar podem ocorrer.

Recentes progressos na clonagem molecular de alérgenos do Aspergillus fumigatus possibilitou não só novas técnicas diagnósticas como esclareceu as bases moleculares e natureza da ABPA,43-45 Antígenos recombinantes de A. fumigatus rAsp f1, rAsp f2, rAsp f3, rAsp f4 e rAsp f6 estão agora disponíveis para aplicação comercial.

Dois grandes estudos demonstraram recentemente a utilidade de rAsp f1 e f2 na diferenciação de sensibilização por Aspergillus e ABPA.46,47 Detectou-se que IgE contra rAsp f1 produziu a melhor combinação de sensibilidade (89%) e especificidade (100%). A sensibilidade e especificidade de IgE tanto contra rAsp f1 (limiar, 4,5 kUA/L) ou rAsp f2 (corte, 1,3 kUA/L) para diagnóstico ABPA foi de 100% e 81%, respectivamente.45 Futuras diretrizes devem integrar IgE contra rAsp f1 e f2 no diagnóstico de ABPA.48

Os testes de função pulmonar tipicamente demonstram um padrão obstrutivo em decorrência do broncospasmo ou da impactação brônquica, durante os estágios I, III, IV e frequentemente também no estágio V. Entretanto, o achado mais frequente do estágio V é a alteração ventilatória restritiva, com redução na Capacidade de Difusão pelo Monóxido de Carbono. (DLCO). 

O diagnóstico da ABPA é estabelecido utilizando-se os critérios de Rosenberg e Patterson5 (Tabela 2) que em 1977 propuseram inicialmente sete elementos. Posteriormente, Greenberger e Patterson6 acrescentaram mais um, os anticorpos IgE e/ou IgG específicos para Aspergillus fumigatus.

Tabela 2 Critérios Diagnósticos para a Aspergilose Broncopulmonar Alérgica

CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS PARA ASPERGILOSE BRONCOPULMONAR ALÉRGICA
CRITÉRIOS MAIORES
• Asma
• Bronquiectasia central/proximal com redução normal dos brônquios distalmente
• IgE sérica total elevada > 1.000 ng/ml (416 UI/ml)
• Eosinofilia no sangue periférico e escarro (> 500 mm3 no sangue)
• Presença de infiltrados pulmonares transitórios
• Hipersensibilidade cutânea imediata positiva para Aspergillus fumigatus
• IgG e/ou IgE específicos elevados para A. fumigatus (mais de 2 X o valor das amostras do soro (pooled) de pacientes com asma com hipersensibilidade ao Aspergillus)
• Anticorpos IgG específicos precipitinas contra Aspergillus no soro
CRITÉRIOS MENORES
• Presença de Aspergillus fumigatus na expectoração
• Expectoração de moldes brônquicos
• Hipersensibilidade cutânea tardia positiva (tipo III) para antígeno Aspergillus fumigatus

No ano de 2013, o grupo da entidade International Society for Human and Animal Mycology (ISHAM)6 propôs novos critérios de diagnóstico, estadiamento e pontuação para asma grave e fibrose cística, incluindo condições predisponentes sendo que dois critérios eram obrigatórios:

Hipersensibilidade cutânea imediata ao antígeno de Aspergillus ou níveis elevados de IgE específica contra A. fumigatus e

Níveis elevados de IgE total.

Introduziram três critérios menores, sendo necessário dois para o diagnóstico de ABPA:

Presença de anticorpos IgG precipitantes para A. fumigatus;

Alterações radiográficas próprias da ABPA e

Eosinofilia no sangue periférico.

Vários são os critérios de diagnóstico clínico para ABPA. Entretanto, carecem de validação minuciosa e nenhuma regra para micose broncopulmonar alérgica (ABPM) se encontra disponível atualmente.

No entanto, os especialistas em alergia pulmonar consideram que uma proporção substancial de casos com ABPA clínico sensibilizados com A. fumigatus nem todos preenchiam os critérios de Rosenberg-Patterson5 da ABPA ou cumpriam os critérios do ISHAM.6 O Japan ABPM Research Program, apoiado pela Japan Medical Research and Development Organization, desenvolveu novos critérios de diagnóstico de dez componentes para ABPA / ABPM em pacientes que não têm fibrose cística (Tabela 3). Asano et al.49 compararam a sensibilidade e especificidade dos novos critérios aos convencionais para discriminar ABPA / ABPM patológica e diagnosticada por médico, de doenças relacionadas, incluindo impactação mucoide negativa para fungos nos brônquios, pneumonia eosinofílica crônica, asma grave sensibilizada por fungos e aspergilose pulmonar crônica.

Tabela 3 Critérios de Diagnóstico para Micose Broncopulmonar Alérgica em Pacientes sem Fibrose Cística

CRITÉRIOS DE DIAGNÓSTICO CLÍNICO PARA 'ABPM' EM PACIENTES SEM FIBROSE CÍSTICA
1. História atual ou anterior de asma ou sintomas asmáticos
2. Eosinofilia de sangue periférico (≥ 500 células mm3)
3. Níveis elevados de IgE sérica total > 1000 ng/ml (≥ 416 UI/ml)
4. Hipersensibilidade cutânea imediata ou IgE específica para fungos filamentosos
5. Presença de precipitinas ou IgG específica para fungos filamentosos
6. Crescimento de fungos filamentosos em culturas de escarro ou lavado broncoalveolar
7. Presença de hifas fúngicas em "rolhas" de muco brônquico
8. Bronquiectasia central na tomografia
9. Presença de "rolhas" de muco nos brônquios centrais, com base na tomografia/broncoscopia ou história de expectoração de "rolha" de muco
10. Muco de alta atenuação nos brônquios na tomografia
os fungos filamentosos nos critérios 4 a 6 devem ser idênticos
os pacientes que atendem a 6 ou mais desses critérios são diagnosticados como ABPM

Tratamento da Asma :: Situações Específicas - Tratamento da Aspergilose Broncopulmonar Alérgica

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