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Asma Brônquica

DEFINIÇÃO

Homero, na Ilíada, no canto XV, em o O Despertar e a Cólera de Zeus, um dos maiores épicos da Grécia antiga, empregou pela primeira vez a palavra "asma" (ασθμα, ατος (το): respiração curta) para designar "sufocação angustiante". No passado este termo era utilizado para qualquer manifestação que determinasse dificuldade na respiração. Durante algum tempo, a dispneia paroxística noturna decorrente da falência ventricular esquerda foi denominada de asma cardíaca, sendo que esta terminologia não mais é aplicada a esta condição. O vocábulo asma é utilizado para se referir a uma doença caracterizada por episódios de dispneia com sibilos, determinada por um estreitamento generalizado das vias aéreas intrapulmonares.

A definição da asma como uma doença tem sido objeto de várias conferências internacionais nas últimas décadas, sempre em busca de uma expressão de consenso. As primeiras destas reuniões deram ênfase aos sintomas ou ao que chamamos de desordem de função.

Desta forma, em 1958, a Ciba Fondation Guest Symposium propôs a seguinte definição:1 "Asma refere-se à condição que determina em certos indivíduos um estreitamento brônquico generalizado, com mudanças na gravidade do seu quadro em curtos períodos de tempo, podendo regredir espontaneamente ou sob tratamento, não sendo determinada por doença cardiovascular. As características clínicas são a presença de dispneia, que pode ser paroxística ou persistente, com sibilos e na maioria dos casos reversível após o uso de broncodilatador (inclusive corticoides)."

Embora os patologistas pudessem reconhecer as manifestações macroscópicas clássicas da asma fatal – hiperinsuflação, edema, hipersecreção de muco – a descrição do quadro inflamatório da asma foi relatada pela primeira vez em estudos de autópsia em casos agudos fatais, na década de 60.2 A histopatologia das vias aéreas dos casos mais severos de asma passaram a ser mais bem descritas, sem, entretanto, apresentar aplicabilidade na definição da doença.

Em 1962, o Committee on Diagnostic Standards of the American Thoracic Society3apresentava à comunidade americana a seguinte definição, introduzindo o conceito da hiper-responsividade brônquica: "A asma é uma doença caracterizada pelo aumento da responsividade da traqueia e brônquios, decorrente de uma variedade de estímulos, determinando um estreitamento generalizado das vias aéreas, cuja gravidade se modifica espontaneamente ou sob o efeito de tratamento. O termo asma não é apropriado para a caracterização do estreitamento brônquico resultante de inflamação brônquica generalizada, p. ex. bronquite aguda ou crônica; por doença relacionada à destruição de paredes alveolares, p. ex. enfisema pulmonar; ou por doenças cardiovasculares. A asma, como aqui definida, pode ocorrer em indivíduos com outras doenças broncopulmonares ou cardiovasculares porém, nestas condições a obstrução não se relaciona a estas doenças." No entanto, quando tal definição foi submetida à consideração do Ciba Fondation Study Group em 1971, foi rejeitada por alguns participantes porque pensaram que não definia o que eles aceitariam como uma doença.4

Com o advento da broncofibroscopia e suas técnicas associadas (lavado broncoalveolar, escovado brônquico, biópsia endobrônquica e biópsia transbrônquica), com os avanços principalmente na biologia celular e com a introdução de novas tecnologias, tornou-se possível nos últimos 40 anos conhecer melhor a biologia pulmonar, a complexidade da inflamação, os mecanismos imunológicos e os processos de injúria e reparação, envolvidos na patogênese da asma. Com estes procedimentos se teve a oportunidade de recolher e avaliar os vários tipos de células, inúmeros mediadores químicos, proteínas, enzimas, envolvidos na asma leve e moderada,5.6 passando a definição da asma a abranger também, o nível celular-molecular.

O The National Asthma Education and Prevention Program (NAEPP) do The National Institutes of Health (NIH), em conjunto com a Organização Mundial de Saúde,7 redefiniram a asma em função de suas três principais características: 1) Inflamação crônica das vias aéreas; 2) Parcial reversibilidade da obstrução brônquica e 3) Hiper-responsividade brônquica a uma variedade de estímulos.

Talvez a definição mais extensa seja aquela da Sociedade Britânica de Tórax de 1993:8 A asma é uma condição inflamatória crônica das vias aéreas, cuja causa não está completamente elucidada. Em consequência da inflamação as vias aéreas tornam-se hiper-responsivas e se estreitam facilmente em resposta a inúmeros estímulos. Isto pode resultar em tosse, sibilos, sensação de opressão torácica e dispneia, sendo estes sintomas mais comuns à noite. O estreitamento das vias aéreas é geralmente reversível, porém, em pacientes com asma crônica, a inflamação pode determinar obstrução irreversível ao fluxo aéreo. As características patológicas incluem a presença de células inflamatórias nas vias aéreas, exsudação de plasma, edema, hipertrofia muscular, rolhas de muco e descamação do epitélio."

A asma é uma síndrome clínica heterogênea. Embora agora comecemos a compreender os mecanismos que conduzem alguns dos fenótipos e endotipos da asma, nosso conhecimento permanece limitado, impedindo a definição e o diagnóstico precisos da doença.

Reconhecendo que asma é um termo abrangente que inclui essa heterogeneidade em 2015, a Global Initiative for Asthma (GINA)9 simplificou sua definição de asma para auxiliar no diagnóstico na prática clínica. Esta nova definição, que se mantém na versão GINA atual,10 destaca as características principais da variabilidade na asma, um componente-chave para o seu diagnóstico:

“A asma é uma doença heterogênea, geralmente caracterizada por inflamação crônica das vias aéreas. É definida pela história de sintomas respiratórios, como sibilos, dispneia, opressão torácica e tosse que variam com o tempo e intensidade, juntamente com limitação variável do fluxo aéreo expiratório.”

No entanto, a limitação do fluxo de ar pode se tornar persistente posteriormente no decorrer da doença.

Referências

01.Ciba Foundation Guest Symposium. Terminology, definitions and classification of chronic pulmonary emphysema and related conditions. Thorax 1959; 14:286-99.

02.Dunnill MS. The pathology of asthma, with special reference to changes in the bronchial mucosa. J Clin Pathol 1960;13:27-33

03.American Thoracic Society Committee on Diagnostic Standards. Definitions and classification of chronic bronchitis, asthma, and pulmonary emphysema. Am Rev Respir Dis 1962; 85:762-8.

04.Ciba Foundation Study Group No. 38. Identification of Asthma. Edinburgh: Livinstone, 1971.

05.Beasley R, Roche WR, Roberts JA, Holgate ST. Cellular events in the bronchi in mild asthma and after bronchial provocation. Am Rev Respir Dis 1986;139:806-17.

06.Jeffrey PK, Wardlaw AJ, Nelson FC, Collins JV, Kay AB. Bronchial biopsies in asthma: an ultrastructural quantification study and correlation with hiperreactivity. Am Rev Respir Dis 1989; 140:1745-53.

07.Expert Panel Report 2: Guidelines for the Diagnosis and Management of Asthma. Bethesda, MD, National Asthma Education and Prevention Program, National Heart and Blood Institute. National Institute of Health, 1997.

08.British Thoracic Society. Guidelines for management of asthma: a summary. Br Med J 1993; 306:776-82.

09.Global Strategy for Asthma Management and Prevention. (2015 update) on: https://ginasthma.org/wp-content/uploads/2016/01/GINA_Report_2015_Aug11-1.pdf.

10.Global Initiative for Asthma. Global Strategy for Asthma Management and Prevention, 2022. Disponível em: www.ginasthma.org